Hoje eu vou ser forte e vou conseguir tirá-las da gaveta da mesinha-de-cabeceira. Lê-las uma a uma e pô-las num baú que encontrei no quarto do sotão quando me refugiava dos pensamentos. Hoje, e não vai ser amanhã porque sei que será tarde demais, eu vou ter coragem de me afastar delas e um dia, quando tiver saudades e quiser recordar-te por já não permaneceres na minha mente, vou querer levar o baú até ao jardim. Sentar-me no banco de madeira em plena luz do dia, com raios do sol a baterem-me na cara e o vento da Primavera a elevar-me os cabelos. Vou abrir o cadeado e tirar carta a carta. Olhá-las com o coração, sentí-las como se fosse um cego a tentar perceber de que objecto se trata e rasgá-las. Nesse dia, eu vou desfazer-me totalmente delas. Vou rasgá-las e lançá-las ao lago que se encontra no jardim onde mergulhamos juntos. Vou demorar imenso tempo a fazê-lo para que escureça e, as estrelas me façam lembrar aquela noite deitados na relva, a ver a lua cheia e todos os outros corpos celestes envolventes que preencheram o céu daquela vez.
Hoje será o dia em que as cartas seguirão outro rumo e conhecerão outro ambiente ! Também as cartas vão sentir saudades minhas tal e qual como tu sentias. Também elas vão ter saudades de serem tocadas, e acariciadas como eram dia após dia enquanto ainda te dignavas a dar notícias.