E o sentimento permanecia! A cada dia que passava este em vez de diminuir aumentava. Em vez de regatar com tudo o que lhe ia aparecendo mostrava-se cada vez maior e superior a todos os obstáculos impostos.
E tu?
E tu?
Tu parado, do outro lado do passeio olhavas para mim, calado, quieto, sereno, com lágrimas nos olhos, mas limitavaste a nada fazer. Preferias ver-me ali a ser, à tua frente, consumida pelo amor que tu insistias em ignorar. Preferias ver-me sofrer e auto-mutilareste a presenciar todo aquele consumismo de angústia. Inquietava-te o meu sofrimento mas aumentava-te o ego, o simples facto de eu estar do outro lado do passeio a ser devastada pelo egoísmo demonstrado, pelo superioridade inventada, sabes porquê? Porque eu sei, eu sei que apesar de estares com os teus amigos do outro lado do passeio, as lágrimas que te preenchiam os olhos, que molhavam a tua cara e tu insistias em fazê-las parar de cair, essas mostravam a verdadeira dor de me veres ali, porque eu também sei que tu preferias estar do outro lado comigo, viu-se no teu olhar, via-se nas lágrimas que tentavas esconder, aliás viu-se no pronunciar dos teus lábios o «amo-te» que jamais fora pronunciado tão intensamente por ti.
(...) nunca nenhum movimento teu se tivera mostrado tão inquieto e incomudado. Nunca, mas nunca mesmo tiveras demonstrado tanto sentimento como aparentavam aquelas lágrimas, nunca uma palavra tinha saído dos teus lábios com tanta convicção como ontem.
Nada significou mais que o teu silêncio. Nunca a tua ausência de palavras me fizera sentir tão bem.
E hoje, hoje eu esperava que te esquecesses de mim para que o teu ego permanecesse em alta. Mas esse teu ego já não é o mesmo sem mim, já não é o mesmo desde ontem nem há-de ser a partir de hoje, sabes porquê ?
-Porque amanhã eu não vou chamar por ti. Amanhã serás tu a vir ter comigo!